Nova ferramenta desenvolvida pela Agenda Pública mostra na prática como os dados podem contribuir para a criação de novas soluções
A inteligência de dados é um importante recurso para a tomada de decisões com base em informações previamente identificadas, mensuradas e analisadas. Pensando em como usar essa metodologia para tornar sua atuação ainda mais efetiva, a Agenda Pública criou uma ferramenta inovadora para analisar dados das localidades onde atua. Ela permite uma avaliação comparativa por meio de diversos recortes, contrastando municípios com características semelhantes em diversas categorias. Isso permite buscar boas práticas adotadas nesses municípios para avaliar como reaplicá-las.
A utilização dos dados na gestão pública tem grande potencial para favorecer o desenvolvimento de um território, mesmo quando se trata de pequenos municípios. Com a apuração de dados secundários (mapeados previamente em outras pesquisas ou componentes de bases e, portanto, já disponíveis), é possível compreender e colocar em perspectiva a realidade local, dentro de seu contexto. A coleta de dados secundários é o primeiro passo, seguido da análise e interpretação dos resultados. Em seguida, é importante que a gestão municipal faça uso efetivo desse conhecimento, preveja ações para otimizar os recursos públicos baseadas em evidências, ofereça melhores serviços aos cidadãos de acordo com demandas e avance no desenvolvimento da gestão pública com parâmetros de eficiência.
Metodologia na prática
O município de Serra do Salitre (MG) é primeiro a aplicar a metodologia da Agenda Pública. Com 10,5 mil habitantes, localizado na região de Patos de Minas, no Triângulo Mineiro, o uso da ferramenta possibilitou traçar um panorama atual orçamentário, do financeiro e da gestão fiscal do município. Grandes conjuntos de informações quantitativas, ou seja, bases de dados, foram obtidos no banco de dados públicos Finanças do Brasil (Finbra) e em peças contábeis do próprio município, disponibilizadas no Portal de Transparência Municipal de Serra do Salitre. Tratam-se de dados oficiais e autodeclarados, abertos e disponíveis para análises governamentais e uso em estudos, entre outros fins.
A metodologia se baseou na análise de clusters, ou seja, de grupos de dados segmentados por semelhança para fins comparativos. Com base nas observações do relatório, fica claro que mesmo um município pequeno ou médio pode apresentar dados com alto grau de complexidade.
Em Serra do Salitre, a arrecadação é muito afetada pelo cenário econômico, pela falta de capacidades institucionais locais e, de maneira positiva, pela chegada de um novo empreendimento. O município recebeu recentemente uma fábrica de fertilizantes de grande porte, que afeta diretamente suas receitas no curto prazo.
Resultados in loco
Após a apresentação do diagnóstico pela equipe da Agenda Pública aos servidores da Prefeitura, foi feita uma oficina de indicadores com o objetivo de “traduzir” as análises técnicas e ajudar os participantes a inserir os dados em um contexto que fizesse sentido para eles. A oficina foi bem recebida pela equipe, que pôde cogitar abordagens táticas para operar orçamentos dentro do município. “A secretária de Saúde não pensa mais apenas no próprio orçamento, de maneira isolada – agora, ela consegue enxergá-lo no contexto do orçamento total”, exemplifica Mariana Calencio, coordenadora do Programa de Fortalecimento da Gestão Pública, da Agenda Pública, em Serra do Salitre.
Logo após a oficina de indicadores, foi montado uma oficina de plano de ação para priorização de áreas de atuação, na qual os grupos foram divididos em equipes de projetos e de ações, que mapearam quais seriam os próximos passos para a otimização do trabalho. Foram pactuadas com os servidores 57 ações estratégicas para a melhoria de finanças públicas de Serra do Salitre. Destas, 42% das ações já foram realizadas e parcialmente executadas. Por exemplo, um dos projetos sugeria uma lei que garantia a isenção do Imposto Sobre Serviços (ISS), esta já foi elaborada, aprovada e sancionada.
Futuro inteligente
Segundo a coordenadora Mariana Calencio, ainda há muito o que evoluir nos processos da gestão pública convencional. A inteligência de dados vai muito além da análise preventiva, na verdade. Tem potencial para resolver grandes questões e chegar à raiz de problemas complexos, que pareciam insolucionáveis.
De todo modo, a confirmação local, ou seja, o aproveitamento das narrativas locais representa um recurso importante para o entendimento da situação. A capacidade de ouvir os servidores e a comunidade favorece o emprego responsável da inteligência de dados, como se vê no exemplo a seguir.
A partir do diagnóstico de dados secundários, foi possível observar em Serra do Salitre que a contribuição do Imposto por Transmissão de Bens Imóveis (ITBI) disparou em 2017. O que se poderia concluir a partir dessa informação? Provavelmente, que as alíquotas foram ajustadas, que houve especulação imobiliária ou que novos loteamentos foram lançados. Seriam conclusões precipitadas. Bastou ouvir os servidores da Prefeitura para entender que a razão era outra: a venda de uma única, mas gigantesca, propriedade rural.
Por Lais Cruz